Não podemos falar de Super-Choque sem falar da sua casa mãe, a Milestone Media. Originalmente chamado apenas de Static, o personagem teve seu primeiro título a partir de 1993 por Dwayne McDuffie, Robert Washington III e desenhos de John Paul Leon para a editora. A Milestone, por sua vez, nasceu partir da união de escritores afro-americanos que acreditavam que as minorias não estavam sendo devidamente representadas pelos quadrinhos americanos. Então a editora fecha um acordo com a DC Comics, sob a qual a DC publicaria os seus quadrinhos, mas a Milestone manteria todo o controle legal e criativo, incluindo os direitos autorais. Todos os quadrinhos foram publicados sob a marca Milestone. Junto a isso, nasce Super-Choque, ou no original, Static.
Posteriormente Super-Choque acabou sendo um verdadeiro sucesso no começo dos anos 2000 com a animação de mesmo nome. O desenho marcou uma geração e foi uma ótima adaptação trazendo questões contemporâneas e típicas dos jovens da sua época. Não seria difícil comparar o marco de Super-Choque a Homem-Aranha em 1963 tendo em vista sua abordagem madura mas com uma linguagem jovial.
Chegamos em 2021 e então temos uma nova história a ser contada. Super-Choque: Primeira Temporada de Vita Ayala, Nikolas Draper-Ivey e ChrisCross trouxe uma nova voz ao personagem após quase uma década sem quadrinhos próprios e, de muitas maneiras, sua história parece totalmente nova por causa disso. Este definitivamente não é o quadrinho de 1993 e tão pouco a animação de 2000, estamos falando de algo completamente novo. É claro, esta série busca ter o mesmo impacto e vantagem política que o original teve, embora em muitos casos aparentemente abandone suas raízes mais maduras em favor de algo um pouco limitado em razão da classificação etária.
O carismático Virgil Hawkins está de volta e podemos dizer que ele não é o tipo de garoto que você normalmente encontra nas ruas em um protesto. No entanto, ele sentiu que precisava tomar uma posição. Infelizmente, no primeiro momento em que ele defendeu uma causa pela qual valia a pena lutar, o mundo conseguiu entrar em colapso. De alguma forma, esse gás lacrimogêneo experimental foi lançado matando dezenas, mas deixando Virgil, assim como muitos outros, com novos dons e habilidades extraordinárias. O que ele deveria fazer com esses novos poderes?
Partindo disso, Ayala traz uma abordagem mais introspectiva para o personagem, focando em seus diálogos internos em razão da ação externa. Os leitores são trazidos aos pensamentos de Virgil para entender o medo e a ansiedade que ele está experimentando logo após um evento tão traumático. Desde o primeiro momento, Ayala traz para a história uma metáfora para a ansiedade atual em torno do tratamento da polícia sobre os negros americanos e a maneira como alguns escolheram responder a esses incidentes. Existe uma deslegitimação sobre a causa negra e movimentos como o Black Lives Matter e esse sentimento se reflete no roteiro de Ayala. Isso é trabalhado à medida que o roteiro se expande mostrando aos leitores a perspectiva de vários espectadores que também estão passando pelo mesmo tipo de injustiça.
Quanto ao desenvolvimento e progressão do personagem, temos vislumbres da dinâmica familiar de Virgil antes e depois do incidente que lhe deu seus poderes. Além disso, vemos Virgil lutando com a preocupação e o desespero que o acompanham, tendo em vista ser apenas um adolescente com poderes. No entanto, todas as peças que compõem um herói adolescente estão lá. A raiva e a incerteza com o mundo estão presentes. A necessidade de crescer rápido sem entender as repercussões envolvidas está aí.
Há contudo algumas decisões que parecem estranhas à própria história. Por exemplo, Super-Choque sendo treinado em artes marciais soa como um atalho para explicar como ele pode se tornar um bom herói. É até mostrado como sendo eficaz, apesar de Virgil estar fora de treinamento, o que parece inorgânico.
Tudo isso é lindamente desenhado por Nikolas Draper-Ivey e ChrisCross. A fusão de estilos de Draper-Ivey se destaca de forma ímpar. O estilo de Draper-Ivey e ChrisCross é incrivelmente moderno e dinâmico, por vezes cartunesco, por vezes lembrando um anime e por vezes com um um uso muito profissional da arte digital tais como webtoons e manhwas, o que coloca quadrinhos como este praticamente como precursor para futuros trabalhos na editora.
Seu uso de texturas e padrões nas primeiras lhe conferem um estilo ultramoderno e atrativo, e sua mistura de influências orientais nas últimas edições tornam a conclusão apropriadamente dinâmica e épica para a reintrodução de Super-Choque àquele mundo. Draper-Ivey se comprometeu com identidades visuais distintas e bem definidas para cada personagem, dando-lhes uma identidade própria e natural como se pudesse ser uma pessoa que você ou eu conheceríamos, com uma vida plena, gosto por filmes, roupas e hobbies. O próprio Virgil está bem caracterizado, com uma expressão jovial que se comunica muito perfeitamente com sua personalidade.
Isso também se expande para personagens sendo retratados trocando de roupa. Não é visto com muita frequência, mas a maneira como Draper-Ivey leva um tempo para fazer um personagem usar o que usaria para dormir e usar roupas diferentes para ir à escola em dias diferentes faz com que o mundo pareça muito mais vivido. Não há personagem melhor para usar os efeitos de Draper-Ivey do que Super-Choque e e seu inimigo Raio de Fogo. Os relâmpagos e as chamas saltam da página de forma que as lutas parecem elétricas e vivas dando um tom de animação muitas vezes.
Super-Choque: Primeira Temporada tem muito potencial, sendo viciante e uma leitura extremamente agradável, reintroduzindo este personagem tão emblemático e um mundo onde hoje temos personagens mais diversificados como Miles Morales, Kamala Khan e Superman filho. O quadrinho, de forma competente, é extremamente convidativo e apresenta aos leitores todos os conceitos que eles precisam saber e introduz essa nova leitura do personagem. Enquanto a série continuar a se concentrar nos relacionamentos íntimos de Virgil, nas lutas internas e na cura de seu trauma, possivelmente só melhorará.
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