O termo Espada e Feitiçaria é um gênero bastante popular dentro da cultura pop. Seja no cinema, literatura, quadrinhos e RPG, essa forma de narrar, representando ou não um determinado contexto histórico, caiu no gosto do público — incluindo nós, brasileiros. Cada nicho possui seu universo e formato próprios. Conan não lembra em nada Senhor dos Anéis, que não se parece com Dungeons and Dragons, que é diferente de Games of Thrones, e destoa de Dragonero, que nada tem a ver com… Sláine(!).
— Quem?
— Sláine, o deus-guerreiro celta! Também conhecido como o Deus de Chifres!?
— Nunca ouvi falar!
Pois é! Boa parte das produções do gênero vem dos EUA — pelo menos, as mais famosas –, mas não é errado dizer que cada região do mundo possui um “capa-espada” para chamar de seu. Talvez a única semelhança entre os exemplos citados esteja no visual, já que a presença de bárbaros, anões guerreiros, magos e dragões é quase unânime. Mas o Reino Unido produziu uma versão bastante original e diferenciada, repleta de humor ácido, ultraviolência, horror cósmico e outros elementos fantásticos que dão a essa miscelânia bárbara um caráter bastante peculiar.
O formato (tanto história quanto arte) é o que dá o tom à mitologia do personagem. O padrão antologia, quase sempre pautada na comédia e na violência extrema, permite não só trabalhar arcos fechados, mas explorar também formatos de histórias com pouquíssimas páginas. O objetivo é entreter e passar mensagens dúbias (de caráter torpe, de preferência). O enredo tem como base elementos presentes nas mitologias nórdicas, especialmente a céltica de origem irlandesa. Em oposição às divindades masculinas que regem o panteão de deidades menores, temos a presença da “Deusa” (Danu), avatar da feminilidade que vive em guerra com as outras. Ela concedeu a Sláine a capacidade de incorporar os elementos que fazem parte do universo Dela, conferindo a ele o dom chamado “espasmo da loucura”, que, além de dar-lhe uma aparência assustadoramente grotesca, torna-o praticamente indestrutível como a um berseker.
Aqui não há receio em assumir o lado fantástico ligado ao gênero. Nada fica subentendido. O universo Dark Fantasy está presente, mas com humor bastante escrachado. Na verdade, o que sustenta a série é exatamente isso: humor non-sense, críticas sociais e ao entretenimento de massa (incluindo a própria Nona Arte). Mas a abordagem acabou mudando nos últimos anos. Pat Mills, criador e escritor do personagem, decidiu trocar o sarcasmo e a arte (ora P&B, ora pintada) por tramas mais densas e fotorrealistas. A violência, que era mais um recurso cômico, deu lugar à hiperviolência, com cenas extremamente brutais e sugestivas (sugestão a estupro, inclusive). Mesmo com a mudança de rumo, a qualidade continua alta porque, antes, quando o enfoque estava apenas no humor, as tramas não precisavam ser elaboradas com reviravoltas e outros recursos narrativos, podendo contar com duas páginas de história (ou até menos); em contraposição à nova abordagem, que foi desenvolvida em arcos mais longos, que precisam de várias edições para se concluir.
Apesar de continuar na ativa (talvez nem tanto assim, já que a última série foi concluída em 2021 – Dragontamer), Sláine foi publicado aqui no Brasil irregularmente. Atualmente, a casa editorial do descabelado é a Mythos, que oferece dois formatos: temporada (antologia que mistura diversos títulos da editora britânica) e Graphic Novel (compilação de arcos clássicos do personagem). Recomendadíssimo para quem não deseja ficar apenas no Conan!