Desde a estreia da fase 4 da Marvel Studios, começando pela sua estreia no streaming próprio da Disney, a desenvolvedora não se consolidou exatamente, com as críticas principalmente por parte do público renegando algumas das produções. Apesar de serem produções totalmente aceitáveis, alguns títulos como Eternos, Viúva Negra e Thor: Amor e Trovão não empolgaram fãs ou críticos tanto quanto as entradas anteriores no Universo Cinemático da Marvel, o UCM ou mais conhecido MCU (Marvel Cinematic Universe). Embora muitos apreciem o tom mais leve e a natureza menos interconectada da atual Fase 4, ela foi criticada por soar sem objetivo ou direcionamento e confiar demais na reintrodução de super-heróis já estabelecidos, histórias complicadas e um humor que tende cada vez mais ao brega. A abordagem ousada e nova das fases anteriores parecia faltar aos espectadores que se sentiam cansados de narrativas estereotipadas que retratavam as batalhas de super-heróis tecnicamente impressionantes, mas não ofereciam nada de novo do ponto de vista narrativo ou cinematográfico.
Lobisomem na Noite (Werewolf by Night) estreou em 7 de outubro de 2022, como um especial de 52 minutos diretamente no Disney+, e com esta produção podemos dizer que a promessa, pelo menos ao público em geral e não a este que vos escreve uma vez que adorei algumas das adaptações desta fase, que o MCU pode estar recuperando seu ritmo. A produção também marca a estreia do compositor Michael Giacchino, premiado pelo Grammy, Oscar, entre outros prêmios e em várias produções, como diretor de televisão, o que definitivamente poderia ser um desastre, porém acaba se mostrando uma excelente porta de entrada para este premiado musicista. Giacchino acerta com uma direção segura e já carregada de personalidade, o que denota que o agora também diretor pode ter um carreira proeminente nesta área.
O especial abraça sua homenagem pessoal aos gloriosos filmes clássicos de terror hollywoodianos das décadas de 1930 e 1940, fazendo uso de um estilo retrô, em preto e branco, e a adoção do horror e sangue da velha escola, o especial Lobisomem na Noite da Disney+ pode ser exatamente o que o Universo Cinematográfico da Marvel precisa para despertar um interesse renovado em suas propriedades. Quando o UCM começou em 2008, os fãs ficaram cativados pela visão de seus heróis de infância favoritos sendo arrancados da página de quadrinhos e trazidos à vida nas telas dos cinemas. Homem de Ferro, que naquele mesmo ano estreava junto de Batman: O Cavaleiro das Trevas, alçou ao sucesso e alcançou a marca 585,8 milhões de dólares de bilheteria. Uma marca relativamente modesta para os parâmetros atuais considerando o todo do MCU, porém sucesso o suficiente para o desenvolvimento de mais produções. Dividido em fases, o universo compartilhado de seres fantásticos e ameaças intergalácticas foi sendo desenvolvido ao longo de uma década com cada novo filme sendo construído em direção ao próximo. No entanto, com o climax alcançado em Vingadores: Guerra Infinita e Ultimato, a derrota do seu grande vilão, Thanos, no final da Fase 3, e a saída de muitos dos atores de longa data que retratam os Vingadores, parecia haver uma queda inevitável de uma qualidade impossível de igualar.
É uma tarefa quase hercúlea recapturar a magia de ver os filmes originais do Homem de Ferro ou dos Vingadores. Em vez disso, o novo especial Lobisomem na Noite vai onde os projetos anteriores da Marvel não foram antes, contando um simples conto de moralidade que se concentra mais na caracterização do que nos efeitos. Também não desgasta seu público com um tempo de execução excessivamente longo. No especial, Jack Russell (Gael Garcia Bernal) e sua nova parceira Elsa Bloodstone (Laura Donelly) precisam lutar pela sobrevivência em um labirinto, enquanto seu protagonista busca resgatar seu amigo Homem-Coisa das garras de um bando de caçadores de monstros. O especial não se esquiva dos poderes assustadores do Homem-Coisa ou do Lobisomem enquanto eles destroem seus inimigos.
Enquanto ocasionais momentos alegres cortam a tensão, o que não provoca distração ou perda de ritmo narrativo, o especial mantém seu tom divertido e sombrio ao longo de too o tempo. O humor é transmitido menos por piadas do que por momentos macabros que chocam o espectador com risadas nervosas, como o cadáver em decomposição do patriarca Bloodstone sendo manipulado por marionetes para explicar as regras da caça. Esta cena – como muitas outras no especial – é retratada através de efeitos práticos tradicionais em vez do títpico CGI (Computer Graphic Imagery) ou seja, imagens geradas por computador, a famosa computação gráfica. O uso, extremamente adequado, de efeitos práticos se encaixa apropriadamente no período dos “Monsterverse” (filmes de terror realizados pela Universal na década de 1930) ao qual o especial está prestando homenagem. A homenagem final é para o clássico filme de 1939, O Mágico de Oz, quando o clímax traz o mundo de Werewolf by Night em cores acompanhado pelas cordas suaves de “Over the Rainbow”, deixando nossos heróis com esperança renovada.
Assim como Mulher-Hulk (She-Hulk), e sei que muitos discordarão aqui, o especial de televisão busca estimular os limites tradicionalmente familiares da Disney, contudo a sua própria maneira. Enquanto Mulher-Hulk quebra a quarta parede e propõe reflexos, mesmo que de forma indireta, Lobisomem na Noite se consolida com um visual e estética que abraçam o gore, com decapitações e outras exibições gráficas de violência que excedem o que é normalmente visto na mídia do MCU. A natureza visceral do especial certamente chocará e pode até afastar alguns espectadores, mas outros podem achar revigorante ver conteúdo mais ousado.
Com os inúmeros próximos projetos da Marvel Studios a caminho, parece que a Fase 4 e essa abertura para novos estilos pode abrir portas para mais produções neste estilo. E talvez os espectadores insatisfeitos voltem a sentir a mesma sensação de admiração que perderam ao longo dos anos.